A Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança – Abrace, pioneira no cultivo e distribuição de cannabis medicinal no Brasil, enfrenta uma grave crise institucional. A entidade, que nasceu com o propósito de atender famílias com crianças atípicas e pacientes com enfermidades graves, está no centro de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB), que pede a destituição da atual diretoria. O motivo: denúncias de desvio de recursos, abandono da finalidade social e perseguição interna.
Em entrevista concedida ao programa Balanço Geral, o cofundador da Abrace, Luciano Soares Lima, trouxe à tona acusações sérias contra a atual gestão da entidade. Segundo ele, a instituição foi cooptada por interesses pessoais e financeiros, em total desvio dos princípios que motivaram sua criação.
“A Abrace é uma entidade séria. Mas as pessoas que estão hoje à frente cometeram crimes. Usaram os lucros da instituição para benefício próprio: compra de imóveis, uso indevido de cartões corporativos, e exclusão dos pacientes mais vulneráveis”, afirmou Luciano, que foi tesoureiro da entidade até 2021.
A associação, fundada em Campina Grande, conquistou em 2014 a primeira autorização judicial no país para cultivar e manipular cannabis com fins medicinais. Com uma história marcada por conquistas e avanços no tratamento de doenças como epilepsia, Alzheimer e câncer, a Abrace se tornou referência nacional. No entanto, segundo Luciano, essa trajetória está ameaçada pela má gestão e pela ausência de transparência.
Ele relatou ainda que desde 2021, pacientes que antes recebiam medicamentos gratuitamente passaram a ser cobrados, enquanto médicos locais deixaram de prescrever por falta de acesso e confiança no fornecimento dos produtos.
“A Abrace tirou toda a estrutura de Campina Grande, sem explicações. Crianças e pacientes oncológicos ficaram sem medicamento. Isso é desumano”, denunciou.
Luciano também revelou que parte das denúncias já foram acolhidas pelo Ministério Público, que designou um interventor judicial para a entidade. A expectativa é que, com a auditoria e convocação de novas eleições, a Abrace possa retomar sua missão original.
“A luta é para devolver a Abrace aos associados. Não se trata de fechar a instituição, mas de afastar quem a transformou em negócio particular”, defendeu.
Segundo ele, mudanças no estatuto da associação foram feitas de forma autoritária para concentrar poder em apenas duas pessoas — um casal que hoje responde pela gestão.
Luciano relata que foi demitido, sem justa causa e sem que os associados fossem informados. Não houve qualquer esclarecimento sobre os motivos da decisão.
Apesar dos graves problemas internos, Luciano acredita que o uso medicinal da cannabis está avançando no país, ainda que de forma lenta e desorganizada. Ele defendeu uma regulamentação mais clara e destacou a importância da ciência no debate público, separando o uso terapêutico da estigmatização ligada ao consumo recreativo.
“Hoje não se pode mais dizer que a cannabis medicinal é droga. Ela é um santo remédio para milhares de famílias”, pontuou.
A Abrace, em nota oficial, afirmou que mantém total transparência e colaboração com as instituições públicas, e que a ação do Ministério Público foi ajuizada sem considerar documentos e auditorias que comprovariam a lisura da atual gestão. A associação diz que enfrentará a ação judicial “com os fundamentos legais e constitucionais pertinentes”.
O caso segue na Justiça, e o futuro da principal associação de cannabis medicinal do Brasil está agora nas mãos do Judiciário. Pacientes e famílias aguardam com expectativa uma solução que traga de volta a missão que, um dia, fez da Abrace um símbolo de esperança.
Por Durval Guilherme Ruver.
